terça-feira, 1 de março de 2011

vilém flusser

em sua luta contra a língua falada, as letras (que no fundo, nada são além de lettern mortas, inventadas para organizar a magia de que se fala nos mitos) sorvem para si a vida da língua: letras são vampiros.
as linhas, criadas com essas lettern que ganharam vida, chamam-se textos. etimologicamente, a palavra "texto" quer dizer tecido, e a palavra "linha", um fio de um tecido de linho.

textos são, contudo, tecidos inacabados: são feitos de linhas (da "corrente") e não são unidos, como tecidos acabados, por fios (a "trama") verticais.
a literatura (o universo dos textos) é um produto semiacabado. ela necessita de acabamento. a literatura dirige-se a um receptor, de quem exige que a complete. quem escreve tece fios, que devem ser recolhidos pelo receptor para serem urdidos. só assim o texto ganha significado.
o texto tem, pois, tantos significados quanto o número de leitores.

textos são produtos semiacabados.
suas linhas não só se apressam em direção a um ponto final, como também ultrapassam-no ao encontro do leitor, de quem se espera que o complete.
textos são uma procura do outro, mesmo quando quem escreve está ciente ou não, até mesmo indiferente, mesmo quendo ele desiste enfaticamente, como Kafka, do leitor co-produtor do texto.
pode-se naturalmente querer dividir o universo dos textos por meio de vários critérios, todavia, é comum a todos os textos serem braços estendidos que procuram com ou sem esperança ser abraçados por outro.
é assim a atmosfera do gesto de escrever.

Um comentário:

maria disse...

muito bom! adorei.