..."Talvez toda reflexão sobre a viagem passe por quatro observações, que se encontram uma em Fitzgerald, a segunda em Toynbee, a terceira em Beckett e a última em Proust. A primeira constata que a viagem, mesmo nas ilhas ou nos grandes espaços, nunca provoca uma verdadeira "ruptura", desde que se leve consigo sua Bíblia, suas recordações de infância e seu discurso ordinário. A segunda é que a viagem persegue um ideal nômade, mas como um desejo vão, porque o nômade é, pelo contrário, aquele que não se mexe, que não quer partir e se agarra à sua terra deserdada, região central ( você mesmo diz a propósito do filme de Van de Keuken, que ir para o Sul é necessariamente cruzar aqueles que querem ficar onde estão). É que , segundo a terceira observação, a mais profunda ou a de Beckett, "nós não viajamos pelo prazer de viajar, que eu saiba somos idiotas, mas não a tal ponto"... Então, em última instância, por que, senão para verificar, ir verificar algo, algo inexprimível que vem da alma, de um sonho ou de um pesadelo, nem que seja para saber se os chineses são tão amarelos quanto se diz, ou se tal cor improvável, um raio verde, tal atmosfera azulada e púrpura, existe de fato em algum lugar, lá longe? O verdadeiro sonhador, dizia Proust, é o que vai verificar alguma coisa..."
trecho da carta de Deleuze a Serge Daney
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